Cooperação em comunidade em primeiro lugar. Lições de Santa Rita de Caldas

 

Foto: Anderson Oliveira

                   Surgida junto com Caldas no caminho de passagem entre Cabo Verde e Ouro Fino no ciclo da mineração, desde cedo apropriou em sua identidade a consciência de que sempre se está cumprindo um papel em comunidade e para a comunidade, e o bem estar depende disso. As paisagens de sonho desse canto da divisa entre Minas e São Paulo, que nunca cansam de ser vistas e lembradas, o que estas pessoas produzem, do campo à cozinha, as outras cidades que tem em volta e a habilidade incomum de manter os equilíbrios que modernidade tanto perdeu e procura, tudo isso se funde nos valores da cooperação e da fé totalmente arraigados em Santa Rita de Caldas. Desde sua emancipação do município de Caldas, conquistada pela mobilização da “Associação dos Amigos de Santa”, este sentimento continua, tal que sua colaboração com esta cidade vizinha continua até hoje e foi visível durante a pandemia.

                Sua tradição agropecuária continua até hoje, tanto no café como uva e leite, fazendo com que 19% de sua economia gire em torno das atividades rurais. Estes produtos também são beneficiados em Santa Rita, tanto através da Cooperativa de Leite Coopas como na produção de vinhos e bolachas, que carregam a maior parte dos 18 % do PIB local referentes à produção industrial, que serve tanto para o consumo local como para outros municípios de várias regiões do país. Os setores de comércio e serviços ocupam 35 % do que é gerado, em muita conexão com cidades vizinhas e com um enorme mercado a ser expandido, dado o potencial turístico: faz parte do Caminho da Fé, enorme vitrine através da peregrinação, e do Circuito Turístico Caminhos Gerais, que envolve 12 municípios de Minas e São Paulo. Os 27% restantes de toda sua economia fica a cargo do poder público, e por isso é tão importante sua atuação na recuperação econômica.

                Realmente a atitude da prefeitura foi de priorizar muito a questão da saúde, com um fechamento de 20/3 a 15/4, inclusive fechando a entrada na cidade. Desde 23/3 havia diariamente informativo sobre a evolução da pandemia, e uma orientação saudável mas efetiva sobre os cuidados e a necessidade de distanciamento, o que nitidamente deu resultado, pois o primeiro caso foi confirmado apenas em 29 de junho, com dois casos que os endereços foram cadastrados como de Santa Rita mas de pessoas que nem se encontravam. O primeiro óbito confirmado aconteceu só no dia 30 de julho. Houve uma aceleração dos casos e das mortes a partir da metade de agosto. Muitos vídeos de esclarecimento foram produzidos, e também e orientação para novas estratégias para o comércio.

                O sucesso em relação à preservação da população teve sim suas consequências econômicas, com relatos de estabelecimentos com mais de 10 anos de mercado fechando as portas. No trabalho de articulação e preparação do ambiente empresarial para a crise econômica causada pela pandemia tem que ser destacada a parceria de dois agentes econômicos em especial: a Associação Comercial, Industrial e Agropecuária de Caldas e Santa Rita de Caldas (ACIACS) e da Coisas do Interior, a primeira sediada em Caldas, e a segunda em Santa Rita. A associação mostrou um fundamental papel coordenador entre estes dois municípios tão vinculados, tanto na divulgação de alternativas para negócios como na organização dos comerciantes, como o fez na Festa do Ravioli e divulgando ações da Coisas do Interior, página conhecida e divulgada em boa parte das cidades vizinhas. Pode-se dizer que o fato de ter uma produção de bens alimentícios atenuou a crise provocada pela pandemia, mesmo com os problemas causados pela forte chuva de granizo que aconteceu no começo do segundo semestre deste ano.

                É claro o sentimento de cuidado com o seu povo que vem de Santa Rita de Caldas, e a consciência de comunidade que eles têm. É realmente gratificante terminar a parte mineira deste levantamento com um lugar que dá tanta vontade de conhecer. Esta rede entre vários municípios da qual eles participam tanto na articulação pública do Circuito Turístico Caminhos Gerais como na esfera privada com a ACIACS e a Coisas do Interior, além de suas possibilidades no setor produtivo, definitivamente podem proporcionar um caminho variado e seguro para a recuperação econômica, uma reinvenção sólida e constante, com sua força empreendedora e singela. Estes foram apenas pequenos diagnósticos para colaborar com as cidades, que podem e devem ser aprofundados no futuro. Foi realmente muito gratificante, e deve ter próximos passos. Obrigado, mineiros!

Introdução ao projeto publicada em 15/9/2020

https://rbsustentabilidade40.blogspot.com/2020/09/projeto-rede-de-desenvolvimento-regiao_15.html

Marcos Rehder Batista, sociólogo, doutorando em Desenvolvimento Econômico no Instituto de Economia/Unicamp, pesquisador do NEA/Unicamp e do Urban Living Lab-SP, líder do projeto RB Sustentabilidade 4.0. E-mail: marcosrehder@gmail.com

 


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