Caminhos para a reinvenção. Lições de Ipuiuna
O município de Ipuiuna apresenta
algumas das mais representativas características de Minas Gerais: uma população
pequena e antiga em meio a montanhas que hipnotizam qualquer um pela beleza,
imersa em uma religiosidade edificante que nos traz um cristianismo de mãos
dadas com o legado africano, uma influência enorme das atividades econômicas
rurais, e seus cidadãos se esforçam por manter coisas que considera saradas,
mesmo com toda a voracidade dos dias de hoje. Iniciado em 1760, este povoado
primeiro pertenceu à Caldas e posteriormente a Santa Rita de Caldas, tornando-se
definitivamente independente em 1953, o que não impediu que ao longo dos anos fosse
se tornando uma potência na produção de batata (entre as 3 maiores do Estado).
Como
foi dito, a bataticultura é o carro chefe de sua economia, sendo que 10 % do
PIB vem de atividades rurais, o dobro da média de Minas Gerais. O grande
detalhe é que boa parte da atividade industrial do município tem a batata como
matéria prima, através de empresas de processamento e beneficiamento, tal que o
setor industrial compreende 6,51 % das riquezas produzidas. O setor de comércio
e serviços representa quase 50 % de toda a atividade econômica, o que pode
sinalizar para uma relativa independência local em relação a centros maiores. O
que impressiona são os 33,5 % da economia ligados diretamente ao poder público,
o que indica para um enorme poder da prefeitura para promover o desenvolvimento
local caso ela esteja disposta a elaborar um consistente programa capaz de potencializar
os talentos e as capacidades das pessoas e das empresas que lá existem, em conexão
com a sua região.
É
bem verdade que a pandemia pode ter prejudicado bastante qualquer intenção de crescimento
neste ano de 2020. Se no primeiro semestre a Covid 19 não pareceu um perigo tão
grande assim, tendo seu primeiro caso confirmado em Ipuiuna em 10 de abril e
até julho haviam apenas 2, a partir daí houve uma aceleração com 14 casos no
mês 7, número que dobrou no mês de agosto, sendo que em setembro tivemos 78
confirmações. Este agravamento também aconteceu nas internações, e se até a
metade de agosto giravam entre 2 e 3, a partir de 15/8 foi para 4 e entrou em
setembro com 7 e na primeira semana de outubro somavam 17, sem contar os que já
tinham recebido alta; foram 4 mortes até agora. Estes dados declarados pela prefeitura retirados nesta
terça-feira do site da Secretaria de Saúde do Estado de Minas Gerais mostram
que, apesar de realmente estar ocorrendo uma aceleração da pandemia, há a
necessidade de cuidados especiais em Ipuiuna, como divulgação diária dos casos
e orientação da população e das atividades econômicas, sobretudo comércio e
serviços.
Um
fortalecimento da relação articulada e institucionalizada entre poder público e
setores econômicos urbanos podem ser um embrião para um novo salto de
desenvolvimento no município. Se ela pode se iniciar em um momento triste e
preocupante como o que vivemos, a retomada das atividades da associação
comercial e a criação de uma nova cultura de ações conjuntas entre os dois setores
que mais fazem circular dinheiro na cidade pode, inclusive, garantir o
crescimento de outros setores, como a já forte agropecuária (pois atrairá fornecedores
de insumos e representação e escritórios de negócios) e o extremamente
promissor setor de turismo (rural e de aventura), pois a beleza geográfica é
inegável. A pandemia fez com que a procura pelo comércio local aumentasse em
municípios pequenos por causa do isolamento, e a adoção de muitas tecnologias acessíveis
à todos como os meios digitais de vendas se desenvolveram demais em todos os
lugares, de modo que esta assimilação tecnológica somada à organização imediata
do diálogo da prefeitura com a economia podem ter chegado para ficar,
permitindo um novo horizonte de planejamento para Ipuiuna.
Em
quase todos os lugares a crise provocada pela pandemia exigiu a busca de novos
caminhos, o que a longo prazo pode mostrar que este momento trágico de nossa
história pode sim levar à uma reinvenção promissora para quem souber decidir
aonde quer chegar e pensar com planejamento como chegar. É hora de ousar e
recorrer ao que há de melhor em gestão pública, buscar por profissionais qualificados
capazes de ajudar a prefeitura a planejar e executar a busca pelo futuro, sempre em conexão com os municípios vizinhos (afinal, trabalhamos e fazemos várias coisas neles). A
reorganização é importante, e se desenvolver não significa dar as costas às
coisas tão importantes que trazemos do passado: como já disse em alguns destes
artigos desta série sobre a recuperação econômica na Região de Poços de Caldas,
muitas vezes se modernizar é buscar novas formas de conseguir as antigas cosias
importantes que tanto prezamos. As possibilidades são muitas para Ipuiuna.
Introdução ao projeto publicada em
15/9/2020
https://rbsustentabilidade40.blogspot.com/2020/09/projeto-rede-de-desenvolvimento-regiao_15.html
Marcos Rehder Batista, sociólogo, doutorando em Desenvolvimento Econômico no Instituto de Economia/Unicamp, pesquisador do NEA/Unicamp e do Urban Living Lab-SP, líder do projeto RB Sustentabilidade 4.0. E-mail: marcosrehder@gmail.com
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