Compromisso, união e bem comum de olho no futuro. Lições de São José do Rio Pardo

Foto: Du Amorim

 

             Tive o prazer de experimentar de perto como São José do Rio Pardo funciona, pois fui professor nesta cidade por 3 anos, onde tive um dos melhores ambientes de trabalho que me recordo. É evidente a disposição assumir compromissos com o novo, unir forças e trabalhar de forma organizada em busca do bem comum, para o inovador com objetivos claros, com um sentimento de comunidade impressionante. Eu via ruas centrais sem asfalto por consciência ambiental, forte valorização dos símbolos culturais locais (de Folia de Reis à Semana Euclidiana), uma religiosidade muita atenta às questões sociais. Uma população receptiva e exigente, dialogável e de posições sólidas. Posso dizer que vi tudo isso na forma com que se lidou com a pandemia.

                Desde o começo do século XX há alguma organização do empresariado local, sendo que hoje quase 70% de seu PIB está no setor comercial e de serviços, número que vem aumentando progressivamente desde 2009, o que salienta que pouco foi atingida pela crise de 2015 (se comércio e serviços cresceu é porque o poder aquisitivo não caiu). A agropecuária é representativa em relação aos demais vizinhos de mesmo porte, com 7% das atividades econômicas, com uma diversificação característica. O setor industrial representa 23% da economia, contando com setor mecânico, agroindustrial e um dos poucos municípios da região a contar com uma gigante mundial como a Nestlé, e esta conexão com o mundo é sensível do cotidiano local.

                Pode-se ver nos meios digitais exatamente que a ACI Rio Pardo é extremamente focada em oferecer para seu associado o que ele precisa da forma o mais eficiente possível, orientações seguras e foco nas demandas de seus representados. Ela se envolve sim nas questões da sociedade em geral, sendo uma apoiadora fundamental do Projeto Rio Pardo 2050, diagnóstico que deve expandir demais as possibilidades de desenvolvimento do município, mas entendendo muito bem a posição dela na sociedade. Com isso, está sempre focada em promover o desenvolvimento de um ambiente propício para o sucesso dos negócios locais (tanto que seu presidente trabalha com treinamento de pessoas), o que envolve a geração e manutenção de empregos e a atração não só da população local como da região para seu varejo e demais oportunidades, como ensino e cultura.

                Foi exatamente este espírito de cooperação responsável e focada em salvar vidas, empresas em empregos que ela agiu durante a pandemia, incluindo os mais variados setores de negócios em decisões tomadas coletivamente. Optou por nãos e precipitar, e entendeu que as decisões viriam de um equilíbrio de forças, de modo que entrou nas negociações defendendo seu associado, mas ciente de que o resultado final seria um equilíbrio, podendo assim cumprir sua função sem necessidade de ações judiciais. Sua importância regional provoca uma grande circulação, o que exigiu cuidado redobrado, tal que as decisões do poder público muitas vezes tiveram que ser radicais, sendo que o fechamento total durou basicamente um mês.

                Quanto ação junto aos comerciantes houve uma forte orientação para uso de meios digitais para vendas, como redes sociais e delivery, e se pode sentir uma maior união dos comerciantes no momento de crise. Houve também uma compreensão local da necessidade de uma postura didática sobre os cuidados que evitarão um recuo na luta contra o vírus, o que continuaria prejudicando o mercado e a sociedade como um todo. Isso sem contar distribuição de cartilhas de orientação e mesmo de álcool gel doado por uma empresa e encaminhado para uma série de entidades.

                Trata-se de uma cidade onde impera o bom senso e uma noção clara sobre o papel de cada um para o bem estar e o sucesso. Um empresariado que se organiza de modo exemplar para gerenciar coletivamente o mercado através da ACI Rio Pardo, e que cria outros meios de pensar a cidadania, como o movimento Amigos da Cidade e a Agência de Desenvolvimento, resultado também da articulação dos agentes econômicos locais. Um lugar que realmente estimula qualquer um a atingir o seu melhor e oferece-lo para resultados coletivos. Pode até não haver unidade total, mas as forças locais tendem sempre a articularem-se de forma construtiva, buscando os melhores resultados possíveis para o futuro.

Link para introdução ao projeto “Com a palavra, as associações comerciais”

https://rbsustentabilidade40.blogspot.com/2020/06/crise-com-palavra-as-associacoes.html

Marcos Rehder Batista, sociólogo, doutorando em Desenvolvimento Econômico no Instituto de Economia/Unicamp, pesquisador do NEA/Unicamp e do Urban Living Lab-SP, líder do projeto RB Sustentabilidade 4.0. E-mail: marcosrehder@gmail.com

 

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