Várias janelas de possibilidades. Lições com Estiva Gerbi
Sem dúvida alguma a principal característica econômica de Estiva Gerbi é o fato de ser uma pequena cidade industrial: mais de 36% da economia gira em torno da indústria, quarto maior percentual dentre os 27 municípios aqui avaliados. Inclusive, já no final do século XIX havia ali uma manufatura nascente, vindo através de imigrantes italianos para o então Bairro São José. Ao seu redor também prosperaram importantes centros regionais industriais, como Mogi Guaçu, Itapira e Espírito Santo do Pinhal, estes que acabaram por concentrar um número maior de habitantes, e com isso, estruturas de serviços e comércio bastante fortes, o que explica o fato de apenas 50,18 % da economia estivense seja composto por comerciantes e prestadores de serviços.
Em muitos casos a população de lá busca nas cidades vizinhas opções no varejo, e isso dificulta a formação de um complexo comercial que motive seus empresários a darem sequência a uma associação comercial. Já houve ACE em estiva; inclusive, ainda há registros na internet e até uma página no Facebook, mas ela encontra-se inativa e o telefone indicado é o de uma empresa local, que provavelmente ainda quer reerguer esta importante instituição para o desenvolvimento econômico local. Como foi visto em casos tratados anteriormente por esta série de artigos, as restrições para a atividade comercial podem proporcionar um divisor de águas também para Estiva, uma possibilidade de reinventar os negócios locais.
Durante a pandemia houve um esforço na divulgação de serviços e vendas através de delivery, informado pelas redes sociais e até mesmo no site da prefeitura. O fato de o poder público ter abeto este canal pode sim fazer com que demandas vindas do comércio comecem a mobilizar os micro e pequenos empresários, de modo que estes habituem-se a gerir um ambiente de negócios que entenda a importância da cooperação para terem mais força na hora de reivindicar. Ou seja, pode surgir na prática um sentimento de associativismo que se mostre importante para o poder público, de modo que a prefeitura veja a importância em se ter uma associação comercial como contraponto e como parceira, capaz de perceber coisas que a política não percebe.
Além disso, as dificuldades nos mercados vizinhos podem fazer com que os munícipes passem a consumir no local, o que pode gerar uma relação entre consumo e identidade comunitária, fortalecendo os lojistas. As pessoas deixariam de comprar nas cidades vizinhas e passariam a recorrer às opções locais, pois existe em muitos o sentimento de evitar sair de casa e se expor à contaminação.
Deste modo, a crise pode tanto levar à uma consciência da necessidade de organização através de uma associação como também à formação de um consumo local que antes não havia com tanta força. Aliás, muito além da questão econômica, pode estar surgindo com as restrições, por incrível que pareça, um fortalecimento da auto-estima de Estiva Gerbi, coisa fundamental para o desenvolvimento de qualquer sociedade. Tal sentimento pode levar à um cuidado com os espaços públicos que, em muitos casos, acaba se tornando uma mobilização concreta voltada para o desenvolvimento turístico, alternativa econômica limpa e que exige qualidade dos serviços públicos, envolvendo todos os outros setores em um projeto de cidade, e de fato lá há potencial.
Em resumo, os sacrifícios e restrições provocados pela pandemia podem trazer como resultado melhoras substanciais para a cidade se houverem reações propositivas em relação à crise, tanto por parte da prefeitura quanto pela organização independente da sociedade civil. Pode marcar uma nova realidade local e uma postura diferenciada na sua relação com outros municípios. Muita gente se reinventou e buscou novas oportunidades e novas formas de articulação interinstitucional, e para isso é preciso ter em mãos todas as oportunidades oferecidas em nível regional, estadual, federal e até mesmo internacional. Estas possibilidades se abrem para Estiva Gerbi, como também para todos os demais municípios.
Link para introdução ao projeto “Com a palavra, as associações comerciais”
https://rbsustentabilidade40.blogspot.com/2020/06/crise-com-palavra-as-associacoes.html
Marcos Rehder Batista, sociólogo, doutorando em Desenvolvimento Econômico no Instituto de Economia/Unicamp, pesquisador do NEA/Unicamp e do LEICI/Unicamp, líder do projeto RB Sustentabilidade 4.0. E-mail: marcosrehder@gmail.com
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