Tradição e ruptura. Lições da ACE Divinolândia



                 Divinolândia é conhecida como a produtora de um dos melhores cafés do país, além de referência no setor de saúde da região com um hospital regional. Entretanto, está entre os municípios onde o setor de serviços e comércio tem mais importância na economia (73,9% do PIB), mesmo com uma população pequena (pouco mais de 10 mil habitantes). Esta força nos setores urbanos da economia traz demandas que exigem um dinamismo da Associação Comercial e Empresarial de Divinolândia que dê conta da complexidade de suas características socioeconômicas. São mais de 150 associados, que vão de escritórios de advocacia até agricultores e bancos, e a eles oferece serviços como certificação digital. Isto torna-se um desfio que muitas cidades vizinhas enfrentam, talvez em menor grau: conciliar o mais atual com o tradicionalismo típico de uma cidade do interior.

                Como em quase todos os lugares, o comércio de Divinolândia foi obrigado a aderir a novas formas de trabalhar, pautando no uso de recursos digitais, delivery, ou apresentação dos produtos pela internet e apenas entrega na loja, sem que os clientes entrassem nos estabelecimentos. Esta questão de não entrar na loja mudou muito o modo de vender, pois o espaço comercial e a apresentação da mercadoria nos moldes tradicionais já não são mais elementos essenciais no processo de escolha. Tais mudanças impactam tanto sobre os lojistas como sobre os consumidores, que tiveram e estão tendo que se adaptar, e este processo geralmente é difícil, pois são hábitos enraizados nas pessoas.

                A estratégia da ACE Divinolândia pode ser vista como radical, mesmo em relação à cidades maiores, reforçando a característica de vanguarda do seu setor comercial e de serviços. Seguindo uma tendência desta pandemia, a de adotar de uma vez mudanças que já vinham acontecendo aos poucos e estavam previstas para os próximos 5 anos, irá adotar uma plataforma de vendas digital, como a de Mococa. Através dela, não só apresentará os produtos pela internet, mas a própria venda acontecerá pelo sistema, como fazem as grandes lojas como Magazine Luiza e Lojas Americanas. A associação oferecerá o serviço para seus associados. Isso definitivamente leva seus comerciantes de uma dimensão municipal para uma atuação regional (ou até estadual e  nacional, no caso de produtos especiais).

                Tal iniciativa necessita de uma preparação especial da maioria dos comerciantes, que muitas vezes estão no setor há décadas, e tem dificuldades culturais para transformações mais bruscas. Organizar um grupo de trabalho para prepará-los para a mudança também é uma prioridade para o atual presidente, Bruno Maltempi. Segundo ele, estas dificuldades foram experimentadas durante a quarentena, e já está sendo preparado um projeto para assimilação de novas formas de fazer negócios.

               Vários setores são abarcados pela associação, ela coopera com outros setores com organização independente na cidade (como agricultores e turismo), e uma adoção adiantada de novos meios pode ajudar todos os setores econômicos a se projetarem para o futuro. Uma atuação desta instituição na raiz da sociedade de Divinolândia pode ser um guia, e ela está disposta a isso, pois já está habituada organizar o interesse de vários setores da sociedade. Pode funcionar como um necessário contraponto cooperativo em relação ao poder público, enriquecendo o leque de opções para políticas públicas, sabendo responder rapidamente às privações causadas pela pandemia.

Link para introdução ao projeto “Com a palavra, as associações comerciais”

https://rbsustentabilidade40.blogspot.com/2020/06/crise-com-palavra-as-associacoes.html

 

Marcos Rehder Batista, sociólogo, doutorando em Desenvolvimento Econômico no Instituto de Economia/Unicamp, pesquisador do NEA/Unicamp e do LEICI/Unicamp, líder do projeto RB Sustentabilidade 4.0. E-mail: marcosrehder@gmail.com


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A CNA e a agricultura regenerativa na COP 29

POR QUE NÃO O PROTAGONISMO DO AGRO NA REINDUSTRIALIZAÇÃO?

A agroindústria na Economia Verde