O Fórum Brasileiro de Agronegócios, sustentabilidade e a “Tsunami” 4.0

O Fórum Brasileiro de Agronegócios, sustentabilidade e a “Tusnami” 4.0

Marcos Rehder Batista 

O Fórum Brasileiro de Agronegócios, organizado pelo Global Concil of Sustentability and Market (GCSM), foi uma síntese dos desafios que nossa agropecuária vive hoje: como implementar uma Agropecuária 4.0 tendo a sustentabilidade como parceira. A tônica da verdadeira maratona que tomou esta segunda das 8:25 até as 18:50 foi sobre como recuperar nossa imagem internacional de potência agroecológica, que nos dava um lugar de protagonismo no cenário mundial, não deixando de defender as demandas dos produtores rurais, dos conglomerados até a agricultura familiar. Por isso, buscou a sinergia entre atores produtivos, científicos e políticos, integrando o contexto global a questões concretas locais. Neste sentido, o evento será descrito aqui por uma divisão temática e não pela sequência exata das mais de 40 apresentações, falando primeiro das questões mundiais, reforçadas por pontuações de economistas e entidades de produtores, chegando às ações políticas nas esferas federal, estaduais e municipais.

                Inicialmente idealizado para acontecer no município de Ribeirão Preto, o evento foi por videoconferência devido à pandemia, sendo apresentado por Agostinho Turbian (presidente da GCSM), João Roberto Benites (CEO da J.R. Benites Board & Advisory) e pelo ex-governador Geraldo Alckmin, oferecendo mais de 10 horas de informação sem interrupção. Proporcionou diferentes pontos de vista do agronegócio, para vários segmentos e para produtores de vários tamanhos, mostrando que seus responsáveis possuem uma visão totalmente ampla e versátil do setor, tendo todas as condições para a partir do que foi apresentado se construir uma nova agenda para a agropecuária, acompanhando as necessidades de assimilação tecnológica, do monitoramento à biotecnologia, da escala de produção à sustentabilidade.

                Dado que como importadores e, principalmente, como exportadores, só podemos compreender nosso lugar no mercado agrícola entendendo o contexto global. Por isso, é importante entender o que representantes de Angola, do mundo árabe e da Europa tem a dizer, e todos eles destacam o quanto uma política internacional abre e fecha portas. Os cuidados com sustentabilidade (ambiental, econômica e social) são fundamentais, não apenas porque garantem fertilidade e água, como qualidade dos produtos e prestígio internacional. O Brasil tem uma série de produtos que tradicionalmente visam o mercado externo, como soja e carne, e outros que estão em franca expansão internacional, como o vinho, e por isso precisamos valorizar o quanto ainda somos exemplo em aliar alta produtividade (e qualidade, como garante Fernando Capez) e sustentabilidade, apesar de atualmente estarmos enfraquecidos em nossos resultados ecológicos e em nossa imagem.

                Pode-se dizer que tanto os economistas quanto os profissionais ligados à agronomia destacaram os recentes entraves internacionais causados por problemas nas políticas ambiental e externa. Professores da Esalq e da FGV foram bastante enfáticos em salientar que nosso ativo agroecológico não deve ser negociado em troca de recursos, como tem sido feito, mas como passaporte para mesas de negociação mais elevadas, em assentos mais favoráveis. Não apenas nossa capacidade de preservação, mas créditos de carbono e uma posição privilegiada quanto à capacidade de gerar e difundir ecoinovação também precisa ser explorada, como sistemas de monitoramento em rede (Internet das Coisas) e mecanismos gerenciais em compliance e eficiência, instrumentos da revolução digital... para não falar de biotecnologia. Questões ambientais, além de garantirem as condições naturais para a produção, são em si uma fonte de riqueza, a “Indústria da Sustentabilidade”, pois ser responsável também gera riquezas.

                Esta visão responsável foi reproduzida por lideranças empresariais do setor, como os presidentes da Associação Brasileira de Produtores de Leite (Abraleite), União das Indústrias de Cana-de-Açúcar (ÚNICA), Federação da Agricultura e Pecuária do estado de São Paulo (FAESP), Associação Brasileira de agronegócios (ABAG) e Sociedade Rural Brasileira (SRB). Apesar de reconhecerem os problemas gerados por exceções no meio agrícola, ressaltam que a maioria esmagadora dos produtores tem consciência da realidade de questões como aquecimento global, desmatamentos ilegais e manejo da água. Ressaltam que quem mais perde com a falta de cuidado é o produtor e defendem conscientização e fiscalização. A forma com que eles priorizam o aumento da produção através do investimento em tecnologias mostra o quanto são diferentes de outros setores produtivos: sem dúvida, o conjunto de setores agrupados sob a bandeira da agropecuária forma o grupo de empreendedores que mais fala em investir em tecnologia nacional sem rodeios, não é atoa que são nosso único setor realmente competitivo em nível mundial.

                É preciso que as esferas governamentais se atentem mesmo às demandas por tecnologia e sustentabilidade do agro, e provavelmente ninguém representa esta agenda na esfera federal do que o Deputado Federal Arnaldo Jardim. Ex-Secretário de Agricultura e abastecimento do Estado de São Paulo, é uma força incontestável na Frente Parlamentar do Agronegócio, grupo de onde emana a força política que o Ministério da Agricultura precisa, tanto que a ministra Tereza Cristina foi muito elogiada ao longo do evento. Ele deu um belo panorama geral do que já existe e do que precisa ser feito em Brasília para aprimorar ainda amis nossa produtividade sustentável.

                No que diz respeito aos Estados, governadores de São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraná, Mato Grosso e Tocantins deram uma ideia da heterogeneidade de problemas ao longo do vasto território brasileiro. Também representantes de empresas públicas trouxeram o que tem sido feito, como presidentes de instituições de fomento e planejamento trouxeram alternativas de políticas públicas importantíssimas, além de secretários estaduais. Políticas regionais complementares às nacionais são fundamentais para sanar os problemas específicos de cada canto do mapa, e marcaram presença, com riqueza de detalhes.

                Na base da estrutura estão as prefeituras, onde conjunturas, princípios e políticas se realizam em ações concretas. Experiências de prefeitos de cidades pequenas e grandes, próximas dos grandes centros e cercadas de oásis de lavouras, focadas na agricultura extensiva ou na propriedade familiar produtora de hortifrutigranjeiros, todas contando suas experiências e avanços. Uma reflexão fechada com chave de ouro com a reconstrução histórica de iniciativas locais, estaduais e federais para o desenvolvimento rural municipal feita por Sebastião Misiara, um dos mais importantes representantes do municipalismo na atualidade. Se muitas vezes a agropecuária tem que ser uma ação intermunicipal, é das prefeituras que partem iniciativas de integração, como os consórcios para os Serviços de Inspeção Municipal, estimulados atualmente pelo Ministério da Agricultura.

                Nunca é demais ressaltar que a “Indústria” ou “Revolução 4.0” é competitividade pura, e se temos um setor capaz de liderar a inserção do Brasil nesta mudança tecnológica é o agropecuário. Como nem um outro aspira tecnologia de ponta, sem descuidar das necessidades ambientais. Mesmo havendo discordantes que precisam ser ouvidos, é o setor em que já éramos potencia e onde temos mais chance de prosperar, ainda mais por terem sido os menos afetados pela crise gerada pela pandemia. Talvez falte uma maior integração neste debate 4.0 com a indústria alimentícia, tão próxima do mundo rural mais ainda um pouco fora desta tsunami inovativa, que ou você surfa ou te esmaga... mas este é um desafio a ser perseguido, o bom é que está próximo.

Marcos Rehder Batista, sociólogo, doutorando em Desenvolvimento Econômico no Instituto de Economia/Unicamp, pesquisador do NEA/IE-Unicamp e do SP in Natura Lab/FCA-Unicamp, líder do projeto RB Sustentabilidade 4.0. E-mail: marcosrehder@gmail.com

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A CNA e a agricultura regenerativa na COP 29

POR QUE NÃO O PROTAGONISMO DO AGRO NA REINDUSTRIALIZAÇÃO?

A agroindústria na Economia Verde